domingo, 3 de fevereiro de 2008

O Grande Circo Místico


O médico de câmara da imperatriz Teresa – Frederico Knieps -
Resolveu que seu filho também fosse médico,
Mas o rapaz fazendo relações com a equilibrista Agnes,
Com ela se casou, fundando a dinastia de circo Knieps
De que tanto se tem ocupado a imprensa.
Charlote, filha de Frederico, se casou com o clown,
De que nasceram Marie e Oto.
E Oto se casou com Lily Braun a grande deslocadora
Que tinha no ventre um santo tatuado.
A filha de Lily Braun – a tatuada no ventre,
Quis entrar para um convento,
Mas Oto Frederico Knieps não atendeu,
E Margarete continuou a dinastia do circo
De que tanto se tem ocupado a imprensa.
Então, Margarete tatuou o corpo,
Sofrendo muito por amor de Deus,
Pois gravou em sua pele rósea
A Via-Sacra do Senhor dos Passos.
E nenhum tigre a ofendeu jamais;
E o leão Nero que já havia comido dois ventríloquos,
Quando ela entrava nua pela jaula adentro,
Chorava como um recém-nascido.
Seu esposo – o trapezista Ludwig nunca mais a pode amar
Pois as gravuras sagradas afastavam
A pele dela e o desejo dele.
Então, o boxeur Rudolf que era ateu
E era homem-fera derrubou Margarete e a violou.
Quando acabou, o ateu se converteu, morreu.
Margarete pariu duas meninas que são o prodígio do
Grande Circo Knieps.
Mas o maior milagre são as suas virgindades,
Em que os banqueiros
e os homens de monóculo têm esbarrado;
São as suas levitações que a platéia pensa ser truque;
E a sua pureza em que ninguém acredita;
São as suas mágicas que os simples dizem que há o diabo;
Mas as crianças crêem nelas, são seus fiéis,
seus amigos, seus devotos.
Marie e Helene se apresentam nuas,
Dançam no arame e deslocam de tal forma os membros
Que parece que os membros não são delas.
A platéia bisa coxas, bisa seios, bisa sovacos.
Marie e Helene se repartem todas,
Se distribuem pelos homens cínicos,
Mas ninguém vê almas que elas conservam puras.
E quando atiram os membros para a visão dos homens,
Atiram as almas para a visão de Deus.
Com a verdadeira história do Grande Circo Knieps
Muito pouco se tem ocupado a imprensa.

JORGE DE LIMA
(“A Túnica Inconsútil” - 1938)

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